Com queda nas cópias em papel, Xerox busca novos negócios, como embalagens que “conversam” com clientes.
Ricardo Karbage, presidente da empresa no Brasil, fez uma entrevista exclusiva na série UOL Líderes falando sobre as novas perspectivas da empresa.
Confira!
Clientes vão falar com os produtos
Qual é a tecnologia mais avançada atualmente no mercado da impressão?
O mais importante não é o equipamento em si, mas as aplicações que as empresas podem desenvolver e colocar lá. Estamos desenvolvendo o conceito de aceleração para a impressão 3D, quer seja metal ou plástico, que ainda é um pouco lenta.
Temos tecnologias para embalagens para que elas falem com o consumidor final. Como funciona isso? Você tem uma gôndola de uma loja de cosméticos, por exemplo, e cada embalagem tem um sensor. Quando você retira aquela embalagem com o produto, o sensor detecta, e uma telinha próxima à gôndola explica os benefícios, as características daquele produto [este é um projeto em estudo, que ainda não está pronto].
São inovações que estamos trazendo, algumas já em processo de comercialização. A empresa neste momento está passando por uma transformação forte, e lançamos uma campanha chamada “made to think”, que significa “feitos para pensar”. Pensar não só no presente, mas na criação do futuro.
Quais as grandes transformações que o mercado de impressão viveu nos últimos anos?
Se lembramos o Brasil há 15 anos, o país imprimia mais de 300 milhões de folhas de cheque por mês. Hoje isso praticamente não existe. Essa é uma grande transformação. É uma tendência de mercado: cada vez menos impressão em larga escala.
O conceito da impressão está ficando em segundo plano, porque o mais importante é a existência de um documento. Ele sempre vai existir, quer seja em papel, quer seja digital, não importa se ele foi criado e depois digitalizado ou se ele nunca será impresso. As transformações vão por aí.
Estamos desenvolvendo um conceito muito forte para que o nosso equipamento seja conhecido como uma extensão da força de trabalho de um escritório, como se fosse mais uma pessoa contribuindo para aquele ambiente de trabalho.
Chamamos isso de “workplace assistant”, um assistente de trabalho. É um tablet acoplado [à impressora], com inúmeros aplicativos que automatizam o trabalho em um ambiente de escritório. O equipamento deixa de ser simplesmente saída de papel e passa a compor processos de trabalho nas empresas.
É um equipamento que auxilia em processos de trabalho e que também imprime, se necessário, mas é muito mais que isso. Você pode mandar um documento para o equipamento, e o aplicativo, por exemplo, pode traduzir para 40 idiomas. Pode traduzir e fazer a distribuição para uma empresa que tem filiais no mundo todo.
Temos aplicativos para segmento educacional, nos quais envio teses digitais ou em papel. Elas passam por um processo de inteligência, inclusive de busca na internet, de potenciais plágios e cópias.
Estamos fomentando e incentivando que desenvolvedores coloquem aplicativos no nosso “marketplace”. É uma plataforma aberta, e o céu é o limite. Você pode fazer qualquer coisa: trazer documentos, guardar na nuvem, fazer conexão de uma nota fiscal com um sistema. O documento entra em papel, digitaliza automaticamente e inicia o fluxo de pagamento automatizado. Esse é o conceito que queremos disseminar.
Qual o principal negócio da Xerox hoje?
É uma empresa centenária, muito conhecida como a empresa que criou o conceito de copiadora. Xerox virou verbo [xerocar]. Na verdade, esse conceito de tirar cópias, há muitos anos, ficou obsoleto.
Hoje, apesar de sermos uma empresa chamada Xerox, não temos nenhuma máquina só de xerox no portfólio. Temos equipamentos que também tiram cópias, mas fazem muitas outras coisas.
Nosso negócio vai desde o hardware em si, que são equipamentos multifuncionais que imprimem, tiram cópias e têm todo um conceito de tablet acoplado com aplicativos, até serviços que melhoram processos e gestão de documentos nas empresas.
Nós somos uma empresa B2B (empresa com empresa), ou seja, temos pouca atividade com o consumidor final. No B2C (empresa com consumidor), temos algumas impressoras e equipamentos multifuncionais de pequeno porte, mas o foco do nosso negócio é B2B.
Xerocar está deixando de ser verbo?
Temos que olhar o verbo do ponto de vista do orgulho, aquilo que foi criado, tem sua história, toca o coração de quem viveu isso muitos anos, mas ele também não deixa de ser um impeditivo para a gente colocar na cabeça das pessoas que nós não somos só isso. As pessoas associam muito ainda a empresa a cópias, e não é isso que queremos passar como mensagem hoje em dia. Mas não vamos negar as nossas origens, porque é uma marca forte.
O papel vai acabar?
As novas tecnologias vão levar a uma diminuição na impressão no país?
Acho que sim. O volume de impressão em escritório reduz 5% ao ano. Agora, aquela velha máxima se o papel vai acabar, é difícil afirmar isso. Há uma redução na impressão, porém, você abre outras frentes. Veja algo que vai na contramão: a impressão de livros hoje cresce no Brasil. Apesar de a tecnologia de livro digital já estar disponível há bastante tempo, o volume de impressão de livro é crescente. À medida que mais pessoas passam a ter acesso à educação e cultura, esse volume cresce também.
O senhor acredita que o aumento da impressão de livros é uma característica do Brasil? Porque lá fora as livrarias estão acabando…
Um conceito interessante na impressão de livro [no Brasil] é a impressão por demanda. Daí essa transformação nessa indústria. A tendência é a impressão por demanda, baixas tiragens, um processo mais digital, e é um processo no qual temos ajudado nossos clientes.
É o que estamos vendo hoje na Amazon, por exemplo?
Sim, exatamente, essa é uma tendência.
Quanto tempo o senhor acredita que levará para o fim das cópias de papel?
Ninguém pode afirmar quanto tempo, talvez nunca acabe. O que há é uma tendência de redução, dependendo do ambiente. A beleza é deixar a decisão para quem tem a necessidade, se prefere em papel ou digital. O americano, por exemplo, tem uma indústria de mala direta em papel. Um país extremamente digital e desenvolvido, mas o volume de mala direta que circula nos Estados Unidos é gigantesco.
Com a chegada da internet, aumentou ou diminuiu a quantidade de material impresso?
A internet tende a diminuir, mas por outro lado ela dá um acesso maior à informação. A tendência de diminuição de impressão é um fato. Se é simplesmente por causa da internet, celular ou outra tecnologia, é difícil precisar, mas que há uma redução no uso de papel há, sem dúvida.
A diminuição da impressão impactou os negócios da Xerox?
Em um primeiro momento, sim. E você não transforma uma empresa secular da noite para o dia, mas hoje estamos absolutamente tranquilos porque estamos muito bem posicionados para essa transformação do papel para o digital. Temos softwares, serviços, tecnologia, tudo aquilo que não necessariamente depende do papel. Ainda é um componente importante do nosso negócio, mas, à medida que o mercado vai se transformando, estamos prontos e completamente adaptados a isso.
Qual foi o impacto das fotos digitais no mercado de impressão?
Nós somos fornecedores de impressão para fotografia também. Fornecemos impressoras de maior porte para gráficas e empresas que imprimem fotos que recebem pela internet. Para nós, é um negócio interessante e que está crescendo, exige alta qualidade, está completamente ligado ao mundo moderno de e-commerce.
Preocupação em derrubar menos árvores
O mundo continua desperdiçando muito papel? Como evitar?
As empresas há muito tempo começaram a se preocupar mais com o meio ambiente. Campanhas ligando o uso do papel ao meio ambiente é algo muito comum e já está bastante tempo estabelecido. Isso trouxe uma maior conscientização. Não resolveu tudo.
[No Brasil], a diminuição foi algo forçado, não foi iniciativa de um fornecedor, de uma empresa, mas foi a crise que veio. Com essa crise, as empresas foram buscar redução de custo, e impressão é algo que também é alvo dessa redução. Diminuíram-se as cotas de impressão, e os usuários foram forçados a imprimir menos como direcionamento das próprias empresas.
Além disso, existem tecnologias que podem ajudar a reduzir isso. Por exemplo, aquele conceito do usuário enviar um documento e esquecer na impressora pode ser minimizado no seguinte sentido: eu posso travar a impressora para ela receber aquele arquivo, mas só imprimir se o usuário for lá e/ou passar o crachá ou colocar uma senha para desbloquear aquele arquivo. São proteções para diminuir a impressão.
Fazemos projetos com os clientes, parece uma dicotomia, para diminuir a impressão. Exemplos: distribuição de cotas de impressão por funcionários. A empresa define um determinado limite, colocamos conceitos de “gameficação” nas empresas, onde alguns joguinhos indicam quem está imprimindo mais ou menos, quanto se salvou de árvores. Existem várias formas de fazer, e é preciso estar muito bem alinhado com o interesse das empresas. Não adianta você fazer todo um marketing e no dia a dia ver empresas que não aceitam isso, que precisam imprimir.
As impressoras estão armazenando informações, como vocês tratam a segurança das informações em equipamentos como esse?
É uma preocupação grande porque as impressoras têm sistema operacional, “hard disc”, estão conectadas à nuvem, os dispositivos passam por tecnologias e testes de segurança de altíssimo nível. Nós recebemos certificação do governo americano para tecnologia de segurança dos nossos equipamentos. Investimos muito dinheiro para garantir a segurança, porque entendemos que é uma porta de entrada ou saída de informação, e, como qualquer dispositivo digital, suscetível ao ataque de hackers. Mas a tecnologia que está acoplada é muito segura e certificada.
Estamos falando de impressoras em empresas, mas a impressora que uso em casa tem a mesma segurança?
Você precisa verificar pela característica da impressora se há um sistema operacional, se há um disco rígido acoplado para esse armazenamento. Às vezes ela é só um dispositivo de saída de impressão, e há muito menos riscos. Quanto mais sofisticada, maior preocupação com segurança você deve ter.
Estamos ficando para trás na transformação digital?
Se você pensar na transformação digital, é uma realidade. Onde acho que o Brasil ainda tem uma distância de outros países mais desenvolvidos? Na formação de profissionais com o “mindset” [padrão] digital. Estamos muito longe de ter uma formação rápida completa, sem passar necessariamente por uma universidade. Precisamos de alguma coisa mais acelerada para formar pessoas, formar mais experts nesse mundo digital. Eu sinto muita falta disso nas empresas. A briga por talentos com o mindset digital, mesmo em momentos de crise, é grande.
O senhor considera que esse é um papel do governo ou da sociedade?
Acho que educação é um papel de todos, governo e sociedade. O governo tem que fazer a sua parte naquilo que é a base da pirâmide, mas a sociedade, aquela que pode investir efetivamente em educação, precisa fazer a sua parte também.
Conteúdo original: UOL Economia